O SURGIMENTO DO IMPÉRIO OTOMANO - 5

 Por R. Hussein Silva


CAPÍTULO 2


ERTUGRUL

Na história pré-otomana não existe um herói maior para os povos túrquicos do que fora Ertugrul Ghazi (c. 1190 – c. 1280), o líder da tribo kayi nas fronteiras seljúcidas com o Império Bizantino. Porém antes de falarmos sobre sua obscura história devemos entender um pouco sobre a história da tribo kayi e outras tribos que imigraram para a Anatólia, bem como também a formação dos Beyliques (ou Beylic's), os reinos tribais vássalos do Sultanato Seljúcida de Rum.


O Problema das Fontes


Montar a história pré-otomana é um trabalho árduo e complicado, isso porque as fontes não batem, nem uma com a outra e nem com as peças arqueológicas achadas. O historiador turco Mehmet F. Koprulu (1890 – 1966) disse em um de seus mais famosos livros sobre o Império Otomano: “Depois que o Estado otomano se tornou poderoso, muitas relações familiares, da dinastia governante, também foram forjadas a fim de valorizar sua nobreza e, dessa forma, torná-la mais atraente para certos elementos do império nascente. As várias tradições que fazem de Osman um membro da família Komneno [bizantino] ou traçam sua descendência até o profeta [Muhammad] não têm, é claro, nenhum fundamento histórico. O único resultado positivo que podemos alcançar é que a pequena tribo de Osman pertencia aos Kayi” [1]. Esse pequeno texto nos indica que muitas fontes sobre o período pré-otomano e inicial do império foram forjadas a fim de dar mais nobreza a casa de Osman.

De fato nós notamos que todos os primeiros historiadores otomanos eram, de fato, pessoas que estavam a serviço da própria corte, os colocando claramente a escrever o que a corte queria. A exemplo podemos citar os dois mais antigos Şükrullah (1388–1488) e Dervish Ahmed Aşıkpaşazade (1400 – 1484), o segundo escrevendo ainda o famoso “Sonho de Osman”, que falaremos mais adiante. Ou seja, todos os turcos que escreveram a história dos primeiros otomanos e dos membros antigos da tribo Kayi o fizeram mais de 100 anos após a morte dos personagens relatados, o único contemporâneo a Osman a escrever um livro de história e a citar Osman foi Georgius Pachymeres (1242 – 1310), mas esse era bizantino, e que faz com que os estudiosos não se baseiem muito em seus escritos acreditando que o mesmo seja propaganda contrária ao mesmo [2], porém aqui nós o usamos como fonte, mas de forma geral, trazemos uma história tradicional, as vezes relatando como outros historiadores e outras fontes externas trazem essa história, porém faz com que o período tratado de 1250 a 1300 seja bastante obscuro na história. Mas no final de tudo é consenço entre todos os historiadores que Osman Ghazi, o fundador do Império Otomano era um membro da tribo Kayi, mas tudo o que é consenço acaba aqui.


A Tribo Kayi


Não se sabe exatamente a orígem da tribo Kayi, chegando até a um turcologista russo afirmar que o nome Kayi era uma variação do nome Kiev, sede do poder dos russos medievais [3], ou seja, a tribo seria descendente de antigos russos. Porém o livro de Mehmet Koprulu nos trás mais informações sobre o assunto. Ele começa descrevendo que é muito difícil relatar a qual tribo o primeiro sultão otomano, Osman I, descendia, pois os relatos sobre o assunto são bem obscuros [4] pois as mais antigas literaturas sobre Osman como o livro de autor anônimo Tevarih-i al-i Osman, ou o livro de Şükrullah chamado Behcet ul-Tevarih, ou o livro de história de Uruç Bey (séc. XV) escrito durante o reinado de Murad II (1404 – 1451), todos mencionando apenas que Osman I descendia dos Oghuz, sem relatar qualquer tribo.

Talvez o livro mais antigo a indicar a existência da tribo Kayi seja o Livro de Dede Korkut, escrito possivelmente no século XV indicando que a idéia que os sultões otomanos sejam descendentes dos Kayi tenha surgido na época de Murad II [5], porém Koprulu argumenta que não tinha o porque Murad II forjar sua descendencia, já que na época as antigas tradições tribais dos oghuzes ainda não tinham sido esquecidas, por isso é bem possível que Osman I fora mesmo descendente dos Kayi.

De acordo com as tradições antigas a tribo Kayi teria sido da mais alta nobreza dentro da Confederação Oghuz, e logicamente ajudado a mesma a governar, bem como posteriormente ela teria ajudado os seljúcidas tanto na Pérsia como a entrar na Anatólia. Os oghuzes todos eram nômades, ou seja, quando a Confederação se desfez eles migraram para dentro do território seljúcida buscando proteção. Porém no início do século XIII a situação estava crítica, a tribo era governada por um homem chamado Kaya Alp (morreu em 1214) e habitava numa região muito árida, provavelmente dentro do atual Turcomenistão e para piorar, ouviam as histórias sobre os mongóis que estavam muito próximos e destruíndo tudo.

Quando o filho de Kaya Alp, Suleyman Shah (morreu em cerca de 1225) assumiu a tribo após a morte do pai, mais uma vez eles resolveram imigrar, mais como uma forma de fugir dos mongóis. Durante essa migração, conta a tradição, Suleyman Shah morreu afogado ao tentar atravessar o rio Eufrates, e a liderança da tribo passou para seu filho Ertugrul, que era um guerreiro nato. Foi no início da década de 1230 que o sultão seljúcida Ala al-Din Kayqubad I vai fazer o acordo com Ertugrul para que ele se estabeleça na fronteira ocidental de seu estado e ajude ele a proteger seu estado contra os ataques dos mongóis e bizantinos. Ertugrul acaba por se tornar leal ao Sultão Kayqubad, e ficar a seus serviços, e ele é um dos primeiros a receber o título de Ghazi pelo sultão. Para facilitar seu trabalho e lhe dar autonomia para produzir e explorar a terra o Sultão permite que Ertugrul lidere um reino semi-independente chamado Beylic Kayi (o nome Bey, como já dito anteriormente é uma posição de liderança, normalmente traduzida como Senhor, ou seja, o Beylic[em turco “beyligi”] seria como “Senhorio”). Mas o Beylic Kayi não foi o único formado naquelas terras, pois o sultão as queria proteger, então nomeou vários outros Bey e Beyliques, e antes de darmos continuidade na história dos Kayi, vamos ver a história de alguns desses reinos semi-autônomos construídos na Anatólia.


BIBLIOGRAFIA


[1] KOPRULU, Mehmet Fuad. The Origins of the Ottoman Empire. Albany: The University of New York Press. 1992. Pág. 74.

[2] CASSIDY, Nathan John. A Translation and Historical Commentary of Book One and Book Two of the Historia of Georgius Pachymeres. PhD dissertation, University of Western Australia. 2004.

[3] FINDLEY, Carter Vaughn. The Turks in World History. Oxford: Oxford University Press. 2005. Pág. 55.

[4] Idem 1, pág. 72.

[5] Idem 1, pág. 73.







Comentários

  1. Prezado, foi lançado o livro sobre as seitas xiitas extremistas, que havia prometido? Como posso adquirir o livro sobre A Filosofia Transcendente de Mula Sadrá e Falsa Fatwa - Nossa filosofia?

    Atenciosamente,

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    1. Ainda não, o livro é muito grande, ainda faltam mais de 15 capítulos para traduzir, mas o lado bom é que falta pouco, isso não é nem 25% do livro.
      Quanto ao livro que vc quer vc encontra para baixar em http://www.arresala.org.br/publicacoes/livros e para comprar em: https://www.lojaislamica.com/515508-livros-e-revistas/

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