O FIM DO IMPÉRIO OTOMANO - PARTE I
Por R. Hussein Silva
De repente, um dos maiores
impérios do mundo desmorona, o povo que outrora apoiava o
governo de repente começa a lutar contra ele, começa a
se voltar contra ele. Assim foi o fim de um dos impérios mais
poderosos da Europa durante os séculos XVI, XVII e XVIII, o
império de Sultões poderosos com alcunhas ainda mais esplendorosas como Mehmet II, o Conquistador, ou ainda mais, seu
sucessor, Suleiman, o Magnífico, desmorona. A seguir virá
a história da decadência e do final do Império
Otomano, também chamado de Turco-Otomano, já que seus
governantes e sua base de governo vinha dessa etnia.
Mas como um império tão
poderoso pode desmoronar? Quais os eventos levaram a esse
desmoronamento? Como seu povo via essa queda? Como outros países
viam essa queda? Qual a participação desses outros
países nessa queda? Aqui faremos uma análise de todas
essas questões, vamos analisar temas polêmicos como o
massacre dos búlgaros e o genocídio armênio, mas
principalmente, faremos um levantamento historiográfico do
ocorrido, tentando ser, o mais imparcial possível em todas
essas questões.
O
Início da Queda
Livros didáticos e alguns
historiadores mostram o fim do Império Otomano como
consequência da entrada do país na I Guerra Mundial
(1914 – 1918), porém sabemos que na história os
acontecimentos que mudam o curso da mesma não se dão do
dia para a noite, são resultados de longos processos que se
dão em anos anteriores, ou mesmo em séculos
posteriores, principalmente em se tratando de um império que
fora tão poderoso, pois dificilmente um grande império cairia em 6 anos. Outros historiadores veem como um processo econômico de, além de envolvimentos em diversas guerras com a
Rússia ao longo do século XIX, que tornaram a Crimeia e o Cáucaso lugares de muitas dificuldades de vida para ambos os
lados, também veem a queda como um resultado de não
acompanhamento do Império as mudanças que a segunda
revolução industrial trouxe. Esses não estão
totalmente errados, mas a história se mostra mais profunda do
que isso, por isso alguns escrevem que a queda vem a partir das
reformas empreendidas na década de 1840 (que serão
comentadas posteriormente), porém podemos notar que todos
estão certos, mas a história ainda avança um
pouco mais além disso.
No início do século
XIX o Império Otomano começava a passar por algumas
mudanças, com vários objetivos, até porque,
naquele momento, parecia que o império estava parado no tempo,
guardando muitas de suas instituições como era na época
de sua formação nos fins da Idade Média, então
precisava mudar. Outro fator é que o mesmo queria fazer frente
a outros impérios. No século anterior, o XVIII, a
Inglaterra experimentava a Revolução Industrial, e
começara com isso a tomar outros territórios para a
constituição da mão-de-obra de seus novos
produtos, que vinham aparecendo no mercado com a revolução
e evolução dos meios de produção. Outro
país que entrará nesse jogo foi a França e mais
para o fim do século XIX a Prússia, na qual os otomanos se
aliariam para fazer frente aos ingleses. No final do século
XVIII as fronteiras orientais do Império Otomano estavam
pacificas, pois a Pérsia, único império que batia de
frente com os otomanos na região, mudava de dinastia e poder
frequentemente, mostrando instabilidade política, e com tal,
não enfrentava mais os otomanos, até porque também,
as fronteiras ao sul da Pérsia eram instáveis, pois o
Império Mogul (norte da Índia) era aliado dos otomanos.
Assim, devido a esse contexto, o Império Otomano decidiu-se se
ocidentalizar, em alguns termos, para bater de frente com os impérios
europeus, mas principalmente com a Rússia dos Romanov, que
viviam ameaçando suas fronteiras ao norte.
Lembramos aqui que o Império
Otomano era formado por diversas etnias, línguas, povos,
religiões, e nas províncias europeias como a
Bósnia, Grécia, Bulgária, Romênia e Crimeia, a maioria do povo era cristã, e não
muçulmana, por isso quando aparecia uma ameaça russa o
povo ficava do lado da Rússia, que professava a mesma
religião. Lógico que não podemos apontar os
conflitos apenas como de origem religiosa, pois nesse momento
construía-se a ideia de autonomia nesses locais, um
povo com a mesma religião, língua e etnia se juntavam
sempre para manifestar seu apoio a ideia de nação,
e ganhava apoio de outros países para essa autonomia. Por
exemplo, ainda no século XVIII o Império Otomano
enfrentou uma guerra com o I Reino Saudita, na região do Nejd
(centro da atual Arábia Saudita), na qual já mostrava
sinais de lutas que estourariam em todo o império por autonímia dos povos. O Nejd nunca foi otomano, porém sempre
manteve proximidades com o império, até aparecer os
Saud's, porém sobre a história da Arábia Saudita
comentaremos em outros momentos.
Mahmud
II (1808 – 1839) e o Início da Modernização
Mahmud II entrou no poder logo
após o fim da guerra contra os sauditas e logo começou
a enfrentar problemas locais. No início de seu poder os Paxás,
líderes de estado, conselheiros e nobres, haviam se rebelado
devido as condições ruins que estavam dentro do
império, e os que eram governadores começaram a
proclamar a autonomia de suas províncias, e Mahmud II fechou a
Corte de Confiscos, diminuindo o poder e a influência dos
Paxás. Em 1804, ainda no governo de Selim III (1789 – 1807),
os sérvios se revoltaram contra o Império Otomano,
porém não conseguiram a independência, mas com o
fim do conflito em 1817, os sérvios proclamaram uma
monarquia-autônoma. Isso e o conflito com os gregos, iniciado
em 1821, mostrava a instabilidade no Império nesse momento. Em
1814 foi fundada na Grécia uma organização
secreta chamada Filiki Eteria (Sociedade dos Amigos),
fundamentada na ideia de independência da província
grega do Império Otomano. A organização cresceu
e a primeira revolta ocorreu em 06 de março de 1821 no
Danúbio, que foi derrotada, onze dias depois alguns gregos
declararam guerra ao Império, e em outubro algumas cidades já
estavam nas mãos dos revoltosos, e algumas outras localidades
como Creta e Macedônia também irromperam em revoltas
contra o governo otomano. Mehmet Ali, governador do Egito, mandou seu
filho Ibrahim Pasha para suprimir as revoltas na Grécia, assim
em 1825 grande parte do Peloponeso estava sob controle do Egito, e no
caso, do Império, porém nesse momento a Russia,
a Inglaterra e a França intervém no conflito enviando
navios para dar apoio aos gregos, e após um logo conflito as
forças francesas tomam a Grécia Central em 1828, e a
Grécia torna-se a primeira nação que fora parte
do império a ser totalmente independente deste.
A mais notável ação
de Mahmud II, no entanto, foi feita em 1826, que foi a abolição
dos Janízaros, algo que seria uma preparação para as
reformas Tanzimat, que aconteceria após a sua morte. Para o
Sultão Mahmud II os janízaros eram uma força
ultrapassada, e que vivia, naquele momento, atrapalhando o império.
Assim o sultão decretou uma fatwa (pronunciamento)
dizendo que “modernizaria o exército”, para coloca-los em
pé de igualdade com os europeus. Lógico que os
janizaros se revoltaram, porém foram suprimidos e mais de 4
mil deles tiveram seus bens confiscados pelo sultão e vários
foram executados, num evento que é conhecido como “Incidente
Auspicioso”. Com a modernização do exército
outros elementos europeus começaram a entrar na sociedade
otomana, como roupas, arquitetura, legislação,
organização institucional e reforma agrária,
tanto que apartir desse momento os sultões passaram a se
vestir com uniformes militares claramente europeus.
Assim um novo exército foi
formado, passando a se chamar Sekban-i Cedit, organizado
segundo linhas europeias, com novo armamento, uniformes, mas
principalmente, agora dominado pelos turcos, pois os corpos janízaros, anteriormente era cheio de eslavos, árabes e outras
etnias. Alguns dizem que a reforma foi, talvez, por medo de que esses
traíssem os turcos e se aliassem aos povos que estavam se
rebelando, e como seu conhecimento militar era grande, poderia se
tornar um fardo para o império. Dentro do novo exército
também fora nomeado pelo sultão o corpo dos “Asakir-i
Mansure-i Muhammediye” (Os Soldados Vitoriosos de Muhammad) que era
uma guarda mais próxima ao sultão, que substituiria os janízaros e tinham esse nome para dar um caráter mais
religioso ao exército e deixar claro que era um exército
muçulmano, e isso acabou fazendo com que muitos ex-janízaros sobreviventes se unissem aos cristãos em suas revoltas. Mas,
apesar de ser muçulmano, os novos corpos eram especialmente
comandados por turcos, o que fez com que muçulmanos da Bósnia,
Albãnia e outras províncias árabes perdessem
privilégios, o que geraria revoltas no futuro.
Na próxima parte falaremos
sobre a economia do império, as guerras enfrentadas no meio do
século XIX pelos otomanos, e principalmente, sobre as reformas
Tanzimat.
Bibliografia:
Uma História dos Povos
Árabes, por A. Hourani, 2006.
Decline and Fall of Otoman Empire,
por A. Palmer, 1997.
Muito bom!
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