O FIM DO IMPÉRIO OTOMANO – PARTE IV

Por: R. Hussein Silva

Quando o Sultão Mehmed V (1844-1918) chegou o poder em 1909, ele tinha na verdade, muito pouco poder político, pois no Império ele dividia seu poder com o Parlamento, que era dominado pelos liberais. Já Mehmed, por sua vez, o pouco poder que ele tinha, era controlado pelos Jovens Turcos, que eram principalmente militares descontentes com as políticas de seus antecessores, e um desses militares logo ganharia muito poder: Mustafa Kemal Ataturk (1881 – 1938), conhecido como “O Pai dos Turcos”.

Mustafa nasceu na Salônica (que atualmente fica na Grécia, mas na época era uma cidade otomana) e quando pequeno passou a ser conhecido devido ao seu professor que o chamava assim de “Kemal”, uma palavra turca de orígem árabe que significa “perfeito”, devido a suas habiladades com números. Em 1893 ele foi admitido no Colégio de Guerra, uma academia do exército otomano, na cidade de Manastir (atual Bitola, na Macêdonia do Norte) onde se formou em 1899 e com isso se mudou para Constantinopla, a fim de dar continuidade na carreira militar. Em 1905 ele é enviado como capitão do exército a cidade de Damasco (atual Síria) a fim de ajudar no controle da cidade, porém ali, dois anos mais tarde ele entra em contato com o Comitê de União e Progresso (CUP), o partido dos Jovens Turcos, e adere as suas idéias bem como ao nacionalismo exacerbado, passando a acreditar que o império era uma forma de governo decadente e autoritária, acreditando no modelo inglês de desenvolvimento.

No campo internacional a década de 1910 era cada vez mais triste para o Império Otomano, pois ao se aliar com o Império Germânico os turcos se tornaram inimigos dos grandes impérios, Inglaterra, França e Rússia, que haviam formalizado uma aliança consolidada em 1907. Apesar de liberais e adeptos ao modo de pensar ocidental, os otomanos munca se aproximaram dessas potências devido ao que as mesmas fizeram a eles no passado, como a tomada do Egito e invasão de terras otomanas apoiando revoltosos árabes e de outras etnias e interferindo na política otomana, basicamente, seu ego era maior. A situação estava tão caótica que mesmo países que eram mais próximos, em busca de colônias, invadiram o território otomano, no caso a Itália invadiu três territórios turcos, a Tripolitânia, Cirenáica e Fezzan (que são os três que hoje integram a Líbia) em 29 de setembro de 1911. Cerca de um ano depois os últimos soldados otomanos abandonaram o local e os italianos instalaram ali um regime ditatorial de terror, assassinatos, mortes, estupros e crimes contra os muçulmanos, onde se destacará a resistência heróica de Omar al-Muktar (1862 – 1931). Apesar da humilhação do exército o Império anuncia em 14 de novembro de 1914 a entrada na I Guerra Mundial ao lado dos alemães.

O início da guerra para os otomanos foi mais tranquilo, protegendo suas frentes em seu próprio território, enquanto a Europa guerreava nas trincheiras na frente ocidental. Nessa época, Mustafa Kemal foi colocado como comandante da 19a Divisão do Exército turco que estava sendo enviada para combater um exército aliado chamado ANZAC (Corporação do Exército de Austrália e Nova Zelândia) que chegava a região de Galípoli, em território otomano em abril de 1915. A resistência otomana naquela batalha foi heróica, e sob o comando de Mustafa Kemal, mesmo que aos custos de muitas vidas de ambos os lados. Ao final dessa batalha, em janeiro de 1916, Mustafa saiu aclamado como líder dos militares, mesmo com essa resistência não evitando a humilhação dos turcos. Em outras frentes eram derrotas atrás de derrotas, com a ajuda de franceses e ingleses os árabes tomaram as cidades sagradas de Meca e Medina; Mosul, Bagdá e Jerusalém foram tomadas pelos ingleses; Damasco pelos franceses; e para evitar uma total derrota ao ver a derrota de seus aliados em outras frentes, o Império Otomano assinou a rendição em outubro de 1918. Mehmed V havia morrido em 03 de julho de 1918, por isso quem assinou a rendição foi seu sucessor Mehmed VI (1861 – 1926), e o que restava do Império Otomano, que naquele momento era apenas o que hoje é a Turquia, passou a ser controlado pelos interesses ingleses, apesar de haver um sultão. Os Jovens Turcos se aliaram aos ingleses, bem como a sua ideologia de criar um estado nacional no Império Otomano.

Em meio a esse caos, algo pior ainda ocorreu. Com o fim da I Guerra, os aliados dividiram entre si os territórios otomanos conquistados, porém a Grécia, que havia lutado ao lado dos ingleses e demais aliados, queria uma parte para si, porém seu desejo não foi atendido, e em 1920 a Grécia invade a parte ocidental do Império, tomando terras e expulsando os turcos que ali viviam. Os Jovens Turcos começaram a clamar no Parlamento e para o povo que o sultão não era mais capaz de defender o povo. Os ingleses ajudaram na retirada dos gregos do território turco, porém o sultão perdeu todo seu apoio e renunciou em 1 de Novembro de 1922, e os militares, encabeçados por Mustafa Kemal, agora chamado também de Ataturk (Pai dos Turcos), proclamaram a república.

O título de Califa era importante para os muçulmanos, pois representava a continuação e a sucessão do profeta Muhammad, por isso as novas lideranças aceitaram que Mehmed VI continuasse com esse título (que todos os sultões tiveram), porém ele era meramente religioso nesse momento, sem nenhum poder político, mas Mehmed VI renunciou a esse título poucos dias depois, em 19 de novembro de 1922 em favor de seu sobrinho Abdulmejid II (1868 – 1944). Porém Ataturk e os demais líderes da nova república temiam que Abdulmejid ou seus descendentes se revoltassem contra a república para criar novamente o império, pois o título de Califa ainda representava muito, era um título de liderança dos muçulmanos, um título que poderia convocar uma jihad (guerra sagrada) contra os governantes, e por isso eles preferiram acabar com esse título também e em 03 de março de 1924 eles obrigaram Abdulmejid II a resignar e assinar o fim do califado.

Bibliografia

Uma História dos Povos Árabes, por A. Hourani, 2006.
Decline and Fall of Otoman Empire, por A. Palmer, 1997.
O Império Otomano, de Donald Quataert.


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